Assim como o empregador pode aplicar a justa causa ao empregado que pratica falta grave, o empregado também pode tomar a iniciativa de rescindir o contrato de trabalho por ato faltoso do empregador. É a chamada rescisão indireta, também conhecida como “justa causa do empregador”, disciplinada no artigo 483 da CLT.
Quando reconhecida pelo Judiciário, essa forma de desligamento garante mais direitos e vantagens do que quando o trabalhador pede demissão. Os efeitos são os mesmos da dispensa sem justa causa, conferindo ao empregado o recebimento de verbas rescisórias, como aviso-prévio indenizado, seguro-desemprego e levantamento do FGTS com multa. Já se ele pedir demissão, não pode sacar o FGTS e nem receber a multa de 40% e o seguro-desemprego. Dependendo da situação, o patrão ainda pode cobrar o valor do aviso-prévio não trabalhado.
Recentemente, os julgadores da Nona Turma do TRT de Minas examinaram um recurso envolvendo o tema. Uma trabalhadora, que atuava como faxineira, relatou que, após o término da sua licença-maternidade, estaria sendo obrigada a retornar ao trabalho, apesar de estar com um bebê de quatro meses, totalmente dependente dela. Segundo a mulher, sua volta ao trabalho exporia o bebê a risco de contaminação pelo coronavírus, em razão do grande número de pessoas que circulam na empresa, atuante no ramo de alimentação. Pedia, assim, que fosse reconhecido o risco de contaminação como sendo iminente, com a consequente declaração da rescisão indireta do contrato de trabalho, a fim de prevenir a doença e evitar a exposição do bebê.
Entretanto, a pretensão foi negada tanto pelo juízo da 1ª Vara do Trabalho de Ouro Preto quanto em grau de recurso. Atuando como relator, o desembargador Weber Leite de Magalhães Pinto Filho explicou que a rescisão indireta do contrato de trabalho exige prova robusta da falta grave cometida pelo empregador, suficiente para impossibilitar a continuidade do vínculo de emprego. “A rescisão contratual pela via oblíqua, por ser medida de exceção, deve atender a certos requisitos objetivos, subjetivos e circunstanciais, entre estes o nexo de causalidade e a adequação entre a falta cometida e a penalidade, a imediatidade da punição e a ausência de perdão tácito”, registrou.
No caso, a própria trabalhadora indicou que teve seu contrato suspenso quando engravidou e ficou afastada de suas atividades por ser considerada grupo de risco. Diante das alegações da empregada, o relator não verificou a prática de falta contratual grave por parte da empresa que ensejasse a ruptura contratual por culpa da empregadora.
Na decisão, o magistrado também observou que não se pode extrair flexibilização, em relação à rescisão contratual, das Medidas Provisórias 927/2020 e 936/2020, que estabeleceram regras de flexibilização temporária das normas celetistas no período de calamidade pública. Principalmente porque essas MPs visavam à manutenção dos vínculos de emprego.
A própria trabalhadora não alegou a prática de qualquer ato ilícito por parte da empregadora, capaz de caracterizar a rescisão indireta do contrato de trabalho, conforme avaliou o relator. No entendimento do julgador, não foi provado, ou sequer alegado, que a empresa tenha deixado de adotar medidas sanitárias para prevenção de contaminação pela doença Covid-19.
Com o fim da licença-maternidade, o desembargador considerou que a trabalhadora deve reassumir suas funções. “O fato de retornar ao trabalho após a licença-maternidade não dá ensejo à rescisão contratual por risco de contrair Covid-19, sem justificativa plausível de culpa da empresa”, pontuou. Acompanhando o voto do relator, os demais integrantes do colegiado negaram provimento ao recurso. Não cabe mais recurso dessa decisão. O processo foi arquivado provisoriamente.
Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região